A fama da cerveja alemã é antiga e há muito que ultrapassou as fronteiras da Alemanha. O que talvez não saiba é que uma lei com mais de 500 anos – a Reinheitsgebot – manteve os ingredientes das suas receitas cervejeiras inalterados durante séculos.
A história da cerveja alemã confunde-se com a do próprio país e as suas características tornam-na única. Os alemães não inventaram a cerveja, mas orgulham-se de a terem aproximado da perfeição. A ‘culpa’ é de uma lei de 1516, que surgiu com o propósito de preservar a sua pureza. Conhecida como Reinheitsgebot, apenas permitia o uso de malte de cevada, água e lúpulo. A levedura viria a ser incluída mais tarde, pois ainda não tinha sido descoberta nesta data. Mas já lá vamos, até porque a tradição cervejeira na Alemanha é muito anterior, e continua até aos nossos dias. Aliás, prova disso mesmo são os dados apontados pelo Turismo da Alemanha, segundo os quais há mais de cinco mil cervejas diferentes no país e 1300 cervejeiras, mais de metade das quais na Baviera.
No final do Império Romano, já as tribos germânicas faziam cerveja em casa, uma tarefa que era da responsabilidade das mulheres. No início da Idade Média, tudo mudou. Os senhores feudais quiseram controlar não só as terras, como também a produção da cerveja alemã. O imperador Carlos Magno decretou que todos os estados tivessem uma cervejeira, mas o crescente poder da igreja fez com que os monges se tornassem os produtores-mor.
Existiam 500 mosteiros a produzir cervejas, sendo que 300 se situavam na Baviera, no sul do país. No entanto, os senhores feudais não gostaram de ser ultrapassados e abriram as suas próprias cervejeiras. Enquanto a igreja e a nobreza lutavam pelo poder, a crescente classe dos mercadores aprendeu a arte de fazer cerveja e dominou-a, tal como já fazia noutros setores.
Chegamos ao século XVI e ao célebre ano de 1516. Foi nesta altura que o duque Wilhelm IV da Baviera instituiu a lei da pureza da cerveja, que regulamentou a sua produção naquela região. A norma estipulou o uso de apenas três ingredientes: água, malte de cevada e lúpulo. A levedura ainda não tinha sido descoberta, mas foi posteriormente incluída na receita purista.
Até então, a qualidade da cerveja era muito inconstante. Havia quem adicionasse casca de árvores, raízes e, até, cogumelos potencialmente alucinogénios. Além, das questões sanitárias, há quem diga que a imposição da lei teve também a ver com fatores monetários, para que o trigo fosse usado em exclusivo para o pão. Certo é que a cerveja alemã ganhou qualidade.
Seria preciso esperar até 1871, ano da reunificação da Alemanha, para esta lei ser alargada a todo o território. Se bem que, nesse período, a norma sofreu algumas modificações, tendo regras diferentes para os dois principais tipos de cerveja alemã: as lager - originárias da Baviera - e as ale - das restantes regiões germânicas.
Após o fim da Primeira Guerra Mundial, a lei voltou a ser alterada, tendo ficado em vigor até aos anos ‘80. Nessa altura, a Alemanha passou a seguir as normas da, então, Comunidade Económica Europeia. No entanto, muitas cervejeiras nunca deixaram o método de produção tradicional, o que confere à cerveja alemã características especiais.
Foi também neste período que a lei ampliou a interpretação do termo cerveja: curiosamente, até então as cervejas estrangeiras não eram consideradas cervejas. Certo é que, durante 500 anos, a Reinheitsgebot protegeu as cervejeiras da Baviera e das restantes regiões germânicas, mas também reprimiu a criatividade. A partir daqui alguns cervejeiros optaram por inovar, enquanto outros se mantiveram fiéis à receita purista.
Tipos de cerveja alemã
Os estilos cervejeiros que contam a história da cerveja alemã
As lager são as cervejas alemãs mais conhecidas, mas nem sempre foi assim. Durante muito tempo, as ale tinham mais fama. Até que, com a descoberta da levedura e, depois, com a introdução de sistemas de refrigeração, tudo mudou. A preservação melhorou bastante as lager e a sua produção expandiu-se por todo o país. Com a exceção do vale do rio Reno e dos locais que faziam cerveja de trigo, as lager conquistaram a Alemanha.
Altbier: O nome significa cerveja velha, porque dizem ser esta a mais antiga das cervejas alemãs. Destaca-se pela sua cor de cobre, uma cabeça cremosa, um corpo médio e um final seco. É originária da zona de Dusseldorf e do Reno.
Berliner Wiesse: Como o nome indica é produzida em Berlim e é feita com cerca de 30% de trigo. O sabor é levemente ácido, tem baixo teor de álcool e é um pouco efervescente.
Doppelbock: Bastante maltada e pouco amarga, surgiu no século XVII como uma versão lager das ale feitas nos mosteiros. Tem um teor de álcool que pode variar entre 7% e 13%.
Dunkel: Foi a primeira cerveja a ser sujeita à lei da pureza, logo é a precursora da maioria das lager alemãs. Tem um pouco de amargor, muito malte e um leve sabor a baunilha ou a nozes. O teor de álcool ronda 4,5% a 5,6%.
Helles: Nasceu em Munique no século XIX para concorrer com as pilsner boémias. O nome deriva do termo alemão hell que significa brilhante. O teor de álcool ronda 5%.
Märzen: O nome significa março e foi-lhe dado porque era feita nesse mês. Tem mais lúpulo do que as típicas lager da Baviera, pensa-se que foi feita para durar mais tempo. Foi mostrada ao mundo no Oktoberfest de Munique, em 1872.
Kölsch: É originária da cidade de Colónia e só as cervejas feitas nesta cidade são assim chamadas, ostentando o selo de denominação de origem protegida. De cor pálida, tem baixo teor de malte e pouco amargor.
Rauchbier: Significa cerveja fumada, já que o malte com que é feita adquire essa característica durante o processo de secagem. É oriunda da região de Bamberge. O teor de álcool ronda 4,8% a 6%.
Weissbier: Feita de trigo, é a chamada cerveja branca. Tem sabor e aroma a banana e cravo e, geralmente, não é filtrada.
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